domingo, 30 de agosto de 2009

BUNNY LAKE IS MISSING DE OTTO PREMINGER.

"A música é o exercício de aritmética oculto do espírito que não sabe calcular" (Leibniz)


"O Cinema é a música da luz" (Abel Gance)

sábado, 29 de agosto de 2009

CINEMA EM ESTADO DE GRAÇA


Je préfère idéaliser le réel, sinon pourquoi aller au cinéma? Jacques Demy

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

,e só isso

Na sessão cineclubista de algumas horas atrás, onde exibi, dentro do Ciclo do mês de agosto (“As idéias e os filme da vida de François Truffaut”), Janela Indiscreta de Alfred Hitchcock – um dos filmes que indicaria como representante do cinema para uma galáxia ignorante - recebi o carinho e as palavras inquietas na defesa do cinema, do meu companheiro Aerton Martins (que foi convidado para comentar o filme comigo), além dos mosqueteiros Miguel Haoni e Cauby Monteiro.
Aerton, entre outros ensinamentos, disse que nos sentimos pequenos diante de tal obra e de tal cineasta, sigo à risca e assino embaixo. Vamos tagarelar....
Meu grande amigo Cauby Monteiro, pensador socrático do cinema (já que se nega a escrever, mas profere nas ágoras seus ensinamentos), trouxe – para o âmbito da discussão – algo que nunca tinha ouvido acerca de Janela Indiscreta... algo que também me incitou a escrever sobre um detalhe (nessa obra, que merece um livro para cada plano) que nunca ouvi falarem. Admito que minha pesquisa teórica não vai além de Bazin, Truffaut, Ismail Xavier, artigos virtuais, extras informativos...
Alguém deve ter falado, mas enfim, tagarelar...
Comentei com o Aerton antes da sessão que, além do que já tinha claro sobre o filme na minha mente, tinha algo que ainda me intrigava muito, que julgava o mais misterioso e que considerava mais uma aula sobre a autonomia da mise-en-scene - que atravessa o roteiro: O personagem do tenente Doyle (o nome aí a brincadeira de Hitch com o Sir Arthur Connan), que vai sendo construído aos poucos - não só através dos diálogos que ele mantém sobre o passado e o cotidiano com Jeff, mas quando olha para a bailarina de forma tendenciosa e responde à afronta de Stewart (que pergunta como vai sua mulher) de forma indiferente – atinge, numa sequência inteira, uma profundidade de poesia e mistério que me deixa atônito.
Falo da cena em que ele vai na casa de Stewart e a - inigualável em beleza – Grace Kelly está presente. Ele chega cansado e indiferente, através da visão dos chinelos e da sombra (a sombra de Grace Kelly!), e da audição de uma voz feminina cantarolando, percebe que uma mulher dormirá na casa de Jeff; depois olha para a festa que ocorre na vizinhança, com uma certa melancolia; chega então Grace, que o tenente olha, encantado e prazeroso por presenciar tal beleza, depois disso olha para sua lingerie exposta na sala (Jeff sempre o repreendendo ao acompanhar seus olhares: “Cuidado Tom”), e, depois disso, o plano que me faz vibrar (a chave de ouro!): o plano começa, eles estão balançando seus brandys e o tenente está ouvindo as conjecturações novas do casal sobre o mistério que tentam desvendar, ele escuta até o fim... depois pretende sair do quadro formado pelos três, a câmera abandona os dois e o segue em panorâmica (aqui uma das poucas vezes que a câmera abandona o ponto de vista de Jeff no filme)... ele deixa seu brandy na mesa, olha sem vergonha alguma para a lingerie de Grace, sai do fundo do quadro, e ocupa o lugar soberano do primeiro plano com o fundo desfocado para dizer, com o olhar mais frio do filme, a frase que revela em que ponto está seu relacionamento matrimonial: “Lars Thorwald não é mais assassino do que eu sou”, e corte, e volta o papo, como se nada tivesse acontecido. Enfim, só vivendo as imagens, realmente Hitchcock é desses que alertam que o cinema lida justamente com o inefável!


Enfim, voltando ao ensinamento do Cauby, creio que tem muito a ver com isso, pois foi justamente o que ele disse – no momento em que eu falava do Método Kulekhov adotado por Hitchcock como princípio para grande parte do seu cinema (que sabemos, é extremamente decupado) – sobre também o filme ser uma pérola da encenação dentro do quadro, já que cada janela é vista de fora, em planos fixos, o que se move são os intérpretes dentro dessas janelas (quadros).
Outra coisa que me intriga, e que o mesmo Cauby me disse acerca de “Notorious”, é a relação de um detetive dentro daquele filme com um quadro (que ele olha, olha, estranha, e só isso)... com o Tenente acontece a mesma coisa numa cena anterior; no meio das fotos de Jeff tem um quadro, que ele olha, olha, estranha, e só isso.

Mateus Moura.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Diário sobre Inimigos públicos (10/08)

Acredito que Mann faz o filme de gângster apenas com as regras de gênero que lhe interessam, acrescentando, naturalmente, o tom que permeia sua obra. Creio que o maniqueísmo está longe... Melvin Purvis não é apenas o bandido que quer pegar Dillinger (não é apenas um estereótipo), a cena do diálogo entre as grades com Dillinger revela que ele não deu certo na sua escolha profissional (o que é retificado na cena em que mata inocentes e sente fundo, e no epílogo do filme quando sabemos que ele abandonou a polícia e se suicidou mais tarde), e a cena em que carrega Frechette nos braços não revela nada (longe as explicações), mas perturba. Outra questão é o duelo final entre Dillinger e Purvis gorado, a redefinição do rival e do duelo. Dois duelos acontecem entre Dillinger e homens que nem conhece, um ele vence com o olhar, que o apavora (e este sentimento só o espectador pode completar, pois sabemos o quanto o "fat boy" merece uma surra do Dillinger, mesmo sem ele saber), e o outro é seu assassino: Winstead, o homem do Oeste – Texas ranger – que tem os culhões que Dillinger diz para Purvis – entre as grades – que o policial não tem. Talvez nem Dillinger tenha o que é preciso para um herói do Oeste, Dillinger já é um herói hard-boiled, um herói que se apaixona; e que Purvis sabe de antemão – ao ler o velho diálogo no script - que voltará por amor. Dillinger e Frechette me fazem lembrar Jesse e Tulip, assim como Winstead me faz lembrar o Santo dos Assassinos.

O final é o encontro - no mundo dos policiais científicos e dos ladrões populares - de um ranger e uma índia. Onde Dillinger e Purvis? Afinal, é um filme de bandido e mocinho? Só?

Mateus Moura.

domingo, 9 de agosto de 2009

Diário sobre Inimigos públicos (09/08)

Revendo o filme percebi melhor a incrível trilha sonora, que já tinha percebido pela qualidade das músicas antes, mas que agora vejo a relação tão intrínseca ao filme, como se o som das metralhadoras e rifles nos revelassem a violência do que estamos vendo e as canções os sentimentos que estão acontecendo. O digital é o filme! A película faria um filme de época, daríamos uma volta no museu e assistiríamos como se comportavam as pessoas daqueles tempos. O digital deixa tudo mais cru, mais direto, parece que vivemos o momento, é como se a película fosse mais perto da “arte”, e o digital mais perto da “realidade”. A câmera na mão idem. Parece que estamos presentes em 33, a chegada do avião de Dillinger em Indiana, as câmeras que gravam e que acompanhamos dão mais força a essa busca de realismo. Mann porém lida com um mito, e sabe disso; apenas conta uma estória, e sabe disso. A mesma estória que os filmes de gangster da década de 30 contavam. E o filme conta a estória, grandiosamente cinematograficamente, emocionante, cenas de ação numa telona, finalmente Cinema no cinema! (Quanto tempo fazia?) O filme é simples mas cheio de mistérios, cheio de cenas maravilhosas em seus detalhes, em suas excentricidades, em suas singularidades. Só penso nelas: Uma delas é Purvis carregando Frechette nos braços. Dillinger adentrando o escritório policial, como se já fosse um mito. Penúltima e última seqüências... Que belas, quantas coisas dizem, quantos mistérios! Dillinger vai ao cinema, lá se vê, lembra do amor de sua vida, se emociona, durante mais de 1 hora vive o mundo dos sonhos, com o cinema aprende a aceitar melhor a morte. Winstead, espécie de personagem-destino, Texas ranger que entra no filme e sabe todos os passos que Dillinger vai dar, o mata na saída, porque Purvis é impedido por alguma força e “fat boy” impedido por seu medo e culpa após o olhar fuzilador de Dillinger. A morte de Dillinger é o elogio da era digital. A cena final de repente nos entrega Marion Cotillard bela de um jeito que esperávamos desde o início, a iluminação azula ainda mais as petecas dos interlocutores no campo contracampo. O homem misterioso que soube os passos de Dillinger, o matou e ouviu suas últimas palavras, vem transmiti-las: “Bye bye, blackbird”, os olhos se enchem de lágrimas e ela nunca foi tão linda. O filme poderia terminar nesse close, mas o contracampo é o homem-destino, que fecha a porta.

Mateus Moura.