quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Conduzir

“Be a human being, and a real hero” (College)

Os apocalípticos que durmam ou suicidem-se de uma vez, o Cinema respira a plenos pulmões.

E façamos libações aqui apenas à faceta do Cinema Clássico. Do Novo Cinema Clássico: Quentin Tarantino, James Gray, Wes Anderson, Paul Thomas Anderson, Bong Joon Hoo, Greg Mottola... Nicolas Winding Refn, ele também é um cineasta, de gênero (e de estilo). Um dos caras desse universo contemporâneo.

Drive.


No Tarô de Marselha, o Arcano VII (o Carro), é a segunda lâmina onde surge o ser humano enquanto figura, a primeira é o que o antecede, o Arcano VI (o Enamorado). Do I ao V, contando com O Louco (a carta sem número – ou o 0), todos representam em suas figuras arquétipos, seres sobre-humanos. Na sexta carta, pela primeira vez se apresenta um drama: o homem surge, e com ele o conflito, representado pelo signo da decisão, da escolha, a ação do livre-arbítrio que precisa vir a ser a partir do julgamento de um caráter. Nasce o ego, e com ele o humano – no sentido em que mais o conhecemos. E com o homem, o ego e o conflito, nasce o drama.


O Carro é a segunda figura em que o ser humano surge, agora porém não se trata de um ser em conflito. Porta uma coroa que o torna régio (ligado à divindade), um cetro que o torno poderoso (pelo simples signo), e um olhar que revela a sua força serena (a verdadeira). Não é mais o ego (aquele que deve decidir), é o herói (a consciência humana em busca da auto-descoberta). Todos os símbolos contidos no tarô revelam centelhas da humanidade, mas essas duas em especial parecem traduzir todo o estofo de que são formados os mitos antropocêntricos. E, de quebra, são as cartas que, por analogia, interpretam da forma mais pura a beleza deste filme desse diretor dinamarquês.

Títulos, palavras, assim como as elipses e os intervalos, parecem revelar muitas vezes seus sentidos através de veredas suaves. Como o nome do Arcano VII é 'O Carro', o nome do “conto de fadas” de Refn é 'Drive'. Do personagem principal – da lâmina e da película – não nos é revelado o nome próprio. Ficamos com sua imagem, apenas. Não precisamos de mais nada. É que assim como o personagem d’O Carro, o motorista deste filme não quer sussurrar acerca do ego, mas do Eu. Não é um humano, é um mito – já é o Enamorado, agora é também o Condutor (ou o Conduzido pelo Eu?). Faz o que tem que ser feito. É movido pelo sentimento regido pela ética – subsumida a sensação, a emoção, o intelecto, a intuição e a arte. Para conhecê-lo devemos, como espectadores, assistir seus atos. No Cinema assim postulou Hawks, mas existem outras facetas dessa linguagem...

Drive. Uma única palavra simboliza tudo o que este filme representa em sua essência: Que Diretor! O ritmo de suas transições, as respirações de suas cenas de ação (interior ou exterior), a melodia de seus banhos de luz e sombra, a apoteose de suas câmeras lentas, suas sobreposições, seus contracampos guardados no silêncio, sua mise-en-scéne. Sim, de novo, “pôr em cena” – não há como não se inebriar com mortes tão belas: são poemas visuais, descrições dramáticas que atingem o estado pictórico mais sublime!

Do “novo tradicional”, Drive é uma das navalhas mais rigorosa e sensivelmente forjadas, atravessa-nos as veias, causa-nos vertigem, adentram o nosso sangue. Acompanhar esse balé de imagens-movimento reacendeu o meu fascínio por esse cinema que a todos contaminou.

E me deu vontade, mais uma vez (mesmo que distante recentemente desse cinema), de louvar novamente os velhos mestres: Hawks, Ford, Lang, Walsh, Preminger, Hitchcock, e Leone, Melville, Siegel, Hughes, Ferrara. Mas não devo cair no saudosismo, assim como Refn e todo o grupo de cineastas que citei mais acima não cai. Lembrando a célebre sentença de Henri Langlois, “o cinema é um produto comercial e como tal deve ser queimado; mas atenção, queimado pelo fogo interior”. Assim renascem das cinzas todos esses novos mestres. Clint os acompanha. De Michael Mann, Nicolas Wedding Refn é o filho mais singular. E a Juliana Maués tava certa: Drive realmente é um dos grandes filmes de 2011.

Mateos.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

asas aves homens máquinas vôos

Marey - o caçador de almas - com seu rifle
capturava os animais no campo da eternidade.
Embalsamador do intervalo, enquadrava o ladro.
Vampiro amador, colecionador de instantes,
iluminado pelo alvo, mirou o átimo.
Na prata encontrou o vôo, alçou o ouro.
Entre o negativo e o positivo foi o pólo,
magnético ôntico ótico.
Inventou o primeiro cativeiro-paraíso.
Lá, domesticou com cuidado
os primeiros fantasmas.
E alquimizou seus rastros estáticos,
em êxtase.
Ave, às asas Marey
que souberam como ninguém
engaiolar aves.

Mateos.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

O que está fora de campo é como o que está dentro de campo. Não 2, nem 1 (nem 3 - imperatriz); é: 0

1º o link:

http://www.youtube.com/watch?v=RIKOBzEuyGY&feature=youtu.be


Só uma coisa supera a realidade: a realidade na eternidade.

Quando não importam mais gramáticas, linguagens, técnicas,

apenas revelações.


Nem um milhão de signos poderiam expressar todo

o campo semântico

da fenda, que o abismo do tempo suga para

um em si.


O extraordinário só pode surgir no ordinário,

no intervalo dos fluxos (também fluxo);

no sagrado do presente.

É só um milagre.


... enteogenia a partir da substância Realidade,

em liturgia deste lírico em máquina colhendo-se o Eu,

Parto

lár

no dia 04/01/2012.


Mateos.


p.s: mais um “texto deixaràstros”, imundo de bruxuleios