quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Aquele querido mês de agosto (ou: o mistério que chamamos cinema)



Filme belíssimo o do português Miguel Gomes e sua equipe Som e Fúria. Experimental, faz um
filme único.
"Documentário", "ficção", "fake-documentário", "cinema direto", "cinema verdade", "fábula", "cotidiano". Chato é ficar tentando explicar logicamente onde o filme se encaixa teoricamente. Projeto filmado em dois agostos na região da Beira - um para registrar oniricamente a realidade, outro para confabular amadorísticamente a ficção - a experiência audio-visual é pra deixar qualquer um encantado.
As sobreposições feitas são das mais belas que já vi na sala escura - pictoria e dramaticamente falando. O choro da menina é pra chorar. Filme imperdível no Cine Líbero Luxardo (que estava vazio hoje), apenas até domingo. Está entre os melhores que vi nos últimos tempos.
Um filme que começa com galinhas fugindo de uma raposa e termina com a equipe do filme filosofando sobre som; que tem cenas adolescentes de um primeiro amor físico e inúmeros números de conjunto musical; que propõe o jogo e a observação, o encantamente e a imersão, o ouvido e a visão. Toda a falsidade e verdade que constituem o mistério que chamamos cinema.

Mateus Moura.

domingo, 8 de novembro de 2009

Bad Lieutenant: Port of Call New Orleans



Nicholas Cage encarna o personagem herzogiano por excelência: o que atinge extremos. A competência e a virilidade dessa encarnação é tamanha que acreditamos ter ressuscitado em Klaus Kinski, misturado com o Jimmy Stewart dos faroestes de Mann, e o próprio Cage em sua aventura lynchiana.
O ritmo também é frenético! Um homem que se afunda em drogas; dos répteis aos peixes, seu lugar é a bestialidade, o contato irracional com o mundo, o contato primeiro; Herzog e seu personagem são apenas uma coisa: a besta humana – e se orgulham por isso.
O local que o cineasta escolhe para filmar é o negativo de seu personagem. New Orleans, devastada pelo furacão Katrina, é algo que obviamente vai chamar a atenção de Herzog. Seu interesse sempre foi pela natureza, pela destruição, pela loucura, pelo inexplicável, pela alucinante realidade. Seu mundo ficcional sempre encontrou na geografia do mundo real seu positivo.
O plano-sequência de Cage esperando fora da boite para apreender drogas até o seu fim é de uma força e um realismo violento que a televisão até hoje não consegue chegar.
Filme tomado pela coca, como fora o Scarface de De Palma e o Desespero de Veronika Vozz de Fasbinder, o de Herzog parece conjugar justamente onde esses nervos (alemães e americanos) se tocam, e como produzem faíscas.

Mateus Moura.

p.s1: este texto foi postado no link: http://guia.folha.com.br/cinema/ult10044u647604.shtml
p.s2: este texto e o resto da cobertura que eu fiz da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo serão publicados na revista eletrônica Gotaz (http://gotaz.com.br/). Em breve...