Em In a lonely place é este o movimento emocional chave, que estabelece a matéria-prima desta poesia maldita: a paixão - que se materializa em versos, socos, afagos e tolices. Um homem dominado pela paixão só pode cometer as maiores façanhas, e as piores decepções. Não há meio termo, em cada ação é a vida que se arrisca - de si e daqueles que o amam.
O set-piece de Ray, que poeticamente sintetiza todo esse ethos pathos de seres destinados à tragédia, é também um dos ápices dramáticos da história do cinema.
Os que convivem com esta persona, na tentativa de proteção concomitante ao medo, normalmente mente, mascara; e estes não suportam a infidelidade. Paranóicos por excelência também, explodem em violência quando inseguros assim como explodem em amor quando seguros. O poder da emoção mais sincera emana desses olhos e gestos em momentos como tais; e aí onde o personagem explode o sentimento se desabrocha, e vislumbrasse o inflamável (aquilo que anima).
O automóvel em alta velocidade é um dos símbolos que podem expressar tal ser-sentimento. Como um furacão, acompanhamos o furor de Dixie Steele (Bogart) devastando as estradas rumo ao seu ódio. Sua mulher (Grahame) - que faíscou a dinamite com suas falsidades - teme, agora mais que nunca, o que aquele homem (provável futuro marido) pode fazer em seus acessos de raiva.
Nós, espectadores acompanhando o thriller, nos angustiamos a cada dúbio gesto de Bogart, como quando com a pedra em mãos se prepara para esmagar a cabeça de um inocente ou quando com a mão em torno de Grahame faz o gesto que encenou no relato ficcional de como poderia ter acontecido a morte da jovem pela qual é suspeito.

Enquanto ela agora dirige de volta, ele, num gesto de amor, a envolve com o braço, completando o poema que ela, repetindo suas palavras, buscava recitar. Esse gesto, que há alguns momentos prefigurava um gesto de morte e violência, não recebe aqui apenas uma repetição para salvaguardar uma ambiguidade, ou tão-somente esclarecer uma falsa suspeita. Esse gesto é o gesto que, em ação, revela esta essência, essa emoção que nasce dessa violenta luz, dessa terna treva.
Os versos retornarão ao final, "like a farewell note", enquanto o amor se escorre como ela na parede, enquanto ele, em "the end", assim como no início, retorna ao seu locus: "in a lonely place".

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