sexta-feira, 30 de julho de 2010

Ouvidos livres

Sou RADICALMENTE defensor, sempre, da democratização total da cultura; e tudo que puder ajudar nesse sentido é um prazer imenso.

Conheço muita gente que curte música que realmente faz eu me sentir um ser humano não tão atrasado assim como julgo normalmente.

É que é cada besteira...

Há os que conversam sobre música, são apaixonados por ela, e quando encontram algo que julgam uma jóia rara escondem dentro de suas cavernas de poder, acreditando representar assim o seu amor. Acho que de possessivo já basta o amor sexual, né?

Tem cada coisa...

Tem as rixinhas e mesquinhicizices (que são o mais cômico – pra não dizer trágico): Há os que gostam de algo porque alguém que eles admiram gosta, e os que não gostam porque pessoas que eles não admiram curtem o som.

No meio dessa adolescice toda se insere a revolução de um Los Hermanos, vilipendiada pelos “conhecedores” porque louvada pelos “empolgados”, a música grandiosa de um João Donato, vilipendiada pelos auto-denominados “ingênuos” porque louvada pelos auto-denominados “eruditos”, e por aí vai...

A tolice mais clássica dessas é a dos “alternativos”, que nunca pegaram um album dos Beatles porque “todo mundo gosta”!

É cada critério...

Enfim, cada qual com suas opções de vida, ninguém ta aqui pra salvar ninguém. Só reafirmo que sou RADICALMENTE defensor da libertação total dos ouvidos. Acredito que esse seja o caminho, não de Deus, mas da sensatez.

Vai por mim, vai por mim...

Deixa o artista te sussurrar o segredo dele no teu ouvido.

Esquece o mundo e ouve a música!

Nunca esqueço da forma grotesca como fui apresentado ao jazzista Duke Ellington. Um velho professor que admiro e desprezo muito falava à turma de um tal “Duke”; percebendo que ninguém da sala tinha em mãos o mapa da rota de suas idéias, o digníssimo, com a sua ironia que eu tanto amava e a sua pedagogia que eu tanto odiava, espantado e indignado, questionou: “O que, ninguém aqui conhece Duke Ellington?”. E, estupefato com o silêncio amarelo geral, sentenciou: “Nossa, ta ruim hein?”.

Aquele nome não saiu da minha cabeça, e fui pesquisar. Minha grande torcida era odiar o tal filho da puta essencial que eu precisava conhecer. E com o maior mau gosto do mundo fui me apresentar o tal “Duke”.

E eu ouvi. Só eu & o Duke. E ele me falou tudo dele, sem nenhuma palavra. Desmentiu as fofocas que falam dele por aí, e disse que nem lembrava desse tal professor que eu lhe pronunciava o nome.

Desde então ficamos amigos, e quando nos encontramos, a conversa é franca, sem intermédios.

Meus ouvidos os deixo livres como braços na posição de apanhar uma bela mulher no colo. Somente à ela – a Musa – dirijo minha atenção, pois é nela, entre as pernas das melodias, que se encontra o elixir, que se vivencia o gozo, que se experimenta a essência.

http://www.sumotorrent.com/en/details/449160/Duke%20Ellington%20At%20Newport%201956%20%28Complete%29.html

O Rock não morreu!


http://www.4shared.com/file/227503769/1520869f/Damn_Laser_Vampires_-_Gotham_B.html

domingo, 18 de julho de 2010

Ponyo é uma das animações da década

[Ponyo. 2008. Hayo Miyazaki. Animação]


O resto dos seres humanos que me perdoem, mas Hayo Miyazaki é a maior imaginação viva.

Estar perto não é físico

Tecnicamente o filme é nota 10. Fotografia, figurino, maquiagem, som. Tudo excelente.

Artisticamente o filme é nota 6. Idéias audiovisuais interessantes, rigor estilístico quase surpreendente para um estreante, respeito honesto por um universo banalizado, noção de tempo/espaço cinematográficos.

Não deixe a matemática te enganar, a nota 6 vale muito mais que a nota 10. Há quem acredite que fazer cinema é juntar os melhores técnicos, as atrizes mais gatinhas e enquadrá-los no bom e velho “tema contemporâneo”. Podem fazer o que chamam de um “bom filme”, mas do cinema a maioria ta longe...

Esmir Filho, diretor de Os famosos e os duendes da morte, está próximo. O filme tem tudo que caracteriza justamente o contrário, mas é aí que mora o diretor – ultrapassa os perfumes técnicos, os belos rostos em si e os grandes temas atuais. Ultrapassar não é negar, mas abraçar e avançar. Chegar no cinema.

Não botava fé que o Esmir era um cineasta. Fui assistir a algum o tempo o famoso Tapa na pantera no youtube, e não me interessou mais que outros vídeos da internet.

Não tenho uma proximidade de universo com o filme, a atmosfera emo-folk evocada não me fisga como fisgou vários adolescentes pelo Brasil (apesar de ser já um fã da música de Nelo Johann). Enfim, não falo do filme com amor; não é o caso. Enxergo então de fora o universo, e analiso que temos alguém pensando imagens, planos, movimentos sinestésicos de câmera, mundo sonoro.

São nas sensoriais imagens emaconhadas na conversa dos garotos, no segurar dos planos íntimos em sequências como a do vinho com a mãe, na eficiente e nada banal utilização das imagens digitais e mídias virtuais que Esmir me fisga a atenção.

Vai se tornar publicamente, mas em essência não é apenas um “filme cult”, tal qual, às vezes alguns, delimitam Gus Van Sant.

Na cidade interiorana sulista onde os pais morrem mais cedo, o universo interior de um adolescente é desnudado em cenas livres, que atingem o seu ápice no necrófilo e libertário ménage a trois bissexual platônico. A ponte, símbolo de morte no decorrer do filme, ao fim, ganha o contorno de renascimento. O realismo ao lado do simbolismo.

Um filme para as mães, disse minha mãe. Um filme para os filhos, disse meu irmão.

Um filme para ser visto com cuidado.

Mateus Moura

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Se o nada é a voz do silêncio, o tudo é a voz da música

Ensaio sobre o show do Mini Box Lunar na Conexão Vivo

Alguém soprou antes do primeiro show que vi do Mini Box Lunar que a banda não valia o que o gato enterrava. A merda comeu o gato, e no primeiro boa noite Belém os meus olhos já brilhavam encantados na viagem sensorial daqueles primeiros acordes e versos. No início da noite daquela sexta-feira era outro gato que sorria pra mim, no país das melodias. Front-womens sereias em trajes de seda eram as porta-vozes do sonho lunar, brindado de vento e fumaça nos cabelos esvoaçantes dos movimentos siderais. No corpo do som os 4 caras fazendo um da pesada, do country à jovem guarda, do blues ao game, da marcha ao folk, do gótico ao brega, do cru ao espacial. Tudo numa infantil mania de criar. Banda com identidade transpirando por cada poro de espírito musical. Se a criação é a criança em ação, a pretensão de algo mais do que o lúdico é simplesmente acessório. Este mini box lunar re-ensina, em tom de realejo, a espontaneidade da livre brincadeira presente no verbo “musicar”. A invenção, sem grandes esforços, se faz presente na contemplação audiovisual do sonho, que dura um show. Tão simples. Tão simples quanto isso.

Mateus Moura.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Certos filmes pertencem ao futuro

[2001: Uma Odisséia no Espaço. Stanley Kubrick. 1968]

Ontem vi meu primeiro blue-ray, revi meu primeiro filme favorito: 2001: Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick. Não apenas continua grandioso, mas se expandiu; como o universo misterioso, que, em movimento, o cineasta, alquimicamente, ousa perscrutar.
Um dos caras que me abriram a porta do cinema foi Kubrick, e na sua revisão a sensação óbvia é de que entrei pela porta da frente.
Impossível não se impressionar com o rigor deste cineasta, talvez nunca tenha existido alguém que gostasse mais de filmar do que esse gênio das imagens sonoras.
Os efeitos especiais são mais do que especiais, são espaciais, supernaturais. Ninguém usou o som com tanta propriedade, emprestou músicas com tanta nobreza.
Seu maior tema foram as trevas humanas, os grandes erros necessários da humanidade, os grandes problemas naturais da sociedade.
Maestro; um dos maiores do cinema.

sábado, 3 de julho de 2010

O cabeça-dura do Marcelo Marat

O novo filme totalmente independente de Marcelo Marat, intitulado Puzzle, é um verdadeiro "quebra-cabeças", e isso é evidente não só pelo título. Uma colagem de Isabela Rossellini cantando Blue Velvet no filme homônimo de David Lynch é o prólogo que abre, em grande estilo, a obra, e frisa o interesse da desconstrução narrativa. Mas diferente de Lynch, Marat o faz pelas dificuldades de produção. Vemos o início de 1 filme, o meio de outro e o final de um terceiro (que é uma colagem de si mesmo, do seu antepenúltimo filme: A Cela).

Conheço o cineasta e ele vive insistindo que temos que filmar porque nunca sabemos o dia de amanhã. Escrevo esse texto sabendo as coisas por dentro, conheço os roteiros desses filmes e participei como ator e câmera em 2 deles. Tudo feito sem um centavo, dentro da ética da Abuso Produções.

Lógico que não vou defender este ou qualquer filme por ser feito com ou sem dinheiro, não é esse o caso. É possível, também, que o valor crítico deste texto seja prejudicado aos olhos alheios por um envolvimento emocional de quem escreve, mas a sequência que tanto me impressionou não estava nem nos roteiros que li, nem nas câmeras que manipulei, mas no imaginário cinematográfico do diretor. O corredor, filmado de um ângulo torto, o superclose nos olhos que percorrem o quadro todo, os cômodos vazios, a angústia dessa caminhada rumo ao desconhecido é cinegrafia pura, uma maravilha, coisa de cineasta!

A escola da evolução técnica é fazer filmes, e os da Abuso estão cada vez melhores. Em entrevista extraordinária o cineasta proclamou que cansou de fazer vídeos experimentais, vai partir pra uma web-série agora no mês de julho, trabalhar mais a dramaturgia dentro de um cinema mais narrativo. A referência novamente é David Lynch, Twin Peaks. Vamos aguardar, e trabalhar.

Confira Puzzle no link abaixo:

http://www.youtube.com/watch?v=e5sIm6_kLRk (1)

http://www.youtube.com/watch?v=b_T_s7qHQfM (2)

No âmbito do IDEA ocorrerá a Jornada Paraense de Cineclubes (http://jopacine.wordpress.com/) e a Mostra do Novo Cinema Paraense (com curadoria do Inovacine). Puzzle é um dos filmes que será exibido, com direito à presença do autor no fim da sessão. Em breve divulgaremos melhor a programação e o serviço. Aguardem.

Mateus Moura (03/06/10).

sexta-feira, 2 de julho de 2010

A Copa do Mundo é uma série bacana, recomendo!

Como nós, milhões de pessoas que não podem ir à Copa do Mundo, vivenciamos os jogos?
Se você respondeu "através de uma transmissão audiovisual ao vivo", a resposta está exata! Mas, temos noção da dimensão disso?
Ronaldo Passarinho, em seu blog (http://www.orm.com.br/blogdecinema/), postou algo que estava me interessando mais que tudo nessa copa: os filmes de 90 minutos que eu assistia na tv. Um deles se chamou "Gana X EUA", e o final chamou muito a minha emoção acerca do paralelo entre vitória e derrota que foi estabelecido no discurso cinematográfico, mas essa contemplação da minha parte não foi transparente, percebi que quem escolhia o tempo de permanência daquelas imagens (o "decupador ao vivo") foi construindo o pós-jogo com a alternância de planos curtos de Gana comemorando e planos longos dos EUA lamentando, e aos poucos foi aumentando a duração dos planos de Gana e diminuindo a duração dos planos dos EUA, tudo isso em planos próximos dos jogadores, captando rostos em lágrimas, de felicidade e de tristeza. Foi fazendo esse jogo intimista, a duração de Gana sufocando cada vez mais a dos EUA, até que um plano geral do campo apareceu, e então não víamos mais nenhum jogador do time americano, o gramado tomado pelo time africano. Nesse filme também teve uma câmera lenta que se justificou esteticamente: os dois goleiros em sua luta aérea nos últimos momentos da prorrogação, quando o americano, "melodramaticamericamente", correu para a redenção - aqui, gorada.
No também melodramático jogo de Gana X Uruguai (o "melo" do "drama" sendo as vuvuzelas) percorremos num travelling, depois de um final de prorrogação de reviravoltas estonteantes, a caminhada dos jogadores até a bola para a cobrança do pênalti. A tensão dessa caminhada fez a Janaína sentenciar: "Égua, parece que ele tá indo para gilhotina!". E era o que parecia (senão o que era), e tudo isso emocionalmente possível por causa do bom e velho movimento de câmera (e de grua, diga-se de passagem).
Acho que passo por um fase em que o cinema se comunica espiritualmente comigo mais do que o futebol. Queria fazer esse texto analisando a final (que esperava ser Brasil x Argentina), mas depois do ocorrido, decidi ir despejando logo o meu papo furado...

Aí uma foto do Cristiano Ronaldo, a Lady Gaga do futebol: só mídia! O aparato de gruas e telões atrapalharam bastante a seleção de Portugal