As duas palavras do título são, talvez, as mais sub-interpretadas que conheço.
‘Estética’ é palavra alienígena no senso-comum, por muito tempo achei que quando falavam dessa coisa aí se referiam aos cosméticos e à beleza da pele. À “beleza da pele” até tem a ver conotativamente, já que a pele é o maior órgão do ser humano e a estética o maior da obra de arte. Pra ficar simples – porque de fato o é – estético é sinônimo de artístico, aquilo que é estético é aquilo que busca o belo (o que é o ‘belo’ sendo uma discussão bem mais complicada e diferente a cada obra e a cada propositor). A estética nos chega ao espírito, no caso do cinema, através dos olhos e ouvidos; é a chamada “estética cinematográfica”. Apreendemo-la sensivelmente, mas sua natureza é espiritual. Também é chamado de Estética a ciência que estuda o belo. A ciência trabalha com o discurso lógico-racional, sua metodologia é a das análises; no caso, fazer uma “análise estética” seria construir um conhecimento, através de uma análise lógico-racional, das proposições referentes à questão estética de um objeto.
‘Técnica’ é a parte material, prática, tecnológica, um conhecimento que pode ser adquirido por qualquer um que se proponha a apreendê-lo.
Comparando à linguagem escrita, a técnica seria a língua – instituição convencional da linguagem - que está ao alcance de todos, enquanto a estética seria a poesia – aquilo que ultrapassa o convencional.
Um travelling, por exemplo, é um elemento técnico que está à disposição de qualquer pessoa que tenha uma câmera qualquer e possa se movimentar, a pé ou de cadeira de rodas. Se tecnicamente falamos de um movimento de câmera onde a base se move em Luchino Visconti o chamamos de travelling, se esteticamente compreendemos, contemplamos talvez os maiores sentimentos estéticos (artísticos) de solidão do século passado. Abro um parênteses: (“sentimentos estéticos” são diferentes dos “sentimentos emocionais”, apesar de o conterem em certa instância. O sentimento do “horror estético” de ver uma cabeça decepada num filme é bem diferente de vê-la no dia-a-dia).
Muitos são os que confundem e atrapalham os tais conceitos de ‘técnica’ e ‘estética’, acreditam que a discussão estética de uma obra da sétima arte é pura perda de tempo. Pois a importância enquanto obra artística não estaria na discussão de elementos técnicos como o movimento de câmera, a montagem, a cine-encenação, o som ou o ponto de vista.
E, realmente; ficar apontando “isso aqui é um travelling”, “isso aqui é uma panorâmica”, não é nada profundo. Mas é tal como no abecedário, temos que aprender o bê-a-bá para um dia poder gozar um grande poeta. E não é dever do cidadão aprender a língua, mas é direito do mesmo ter o acesso. E com o cinema deve ser igual.
Sirva-se; e crie.
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